Marquises: todo cuidado é pouco

| 20/12/2017 |

 

Em julho de 2016, uma mulher de 34 anos morreu e outra de 59 anos ficou ferida no centro de Porto Alegre, após a queda de uma marquise em um edifício. Não muito antes, em fevereiro, no bairro carioca de Madureira, uma queda de marquise também deixou uma pessoa morta e quatro feridas. Lamentavelmente, acidentes como esses são mais comuns do que imaginamos e o síndico que tem marquise no seu condomínio deve dobrar, redobrar e triplicar o cuidado com a manutenção para prevenir que casos como esses aconteçam.

No Rio de Janeiro, existe um decreto municipal n.° 27.663, de 9 de março de 2007, que determina a obrigatoriedade da conservação e manutenção por parte dos proprietários de imóveis com marquises. O decreto foi instituído na gestão do ex-prefeito do Rio, César Maia, após dois episódios que chocaram a cidade: a queda da marquise de um bar em Vila Isabel, em março de 2006, lesionando várias pessoas e levando quatro a óbito e, a ocorrência principal, que foi a queda da marquise do Hotel Canadá em Copacabana, em fevereiro de 2007, que também lesionou várias pessoas e levou duas a óbito.

O engenheiro civil, professor e colaborador do Secovi-Rio, Orlando Sodré Gomes, que também é especialista em Manutenção Predial de Engenharia da Universidade Veiga de Almeida e da Universidade Celso Lisboa explica como funciona esse decreto na prática: “O decreto exige a apresentação de uma DSEM: Declaração de Segurança Estrutural das Marquises de imóveis que disponham de marquises construídas sobre logradouros públicos e áreas de afastamento frontal, por parte de seus proprietários, condomínios e outros responsáveis. Essa DSEM será elaborada e assinada por um profissional habilitado e registrado no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) e renovada a cada três anos. Ela deve constatar a segurança estrutural, de acordo com a norma da NBR 5674 da ABTN – Associação Brasileira de Normas Técnicas, sendo capaz de garantir a integridade física do público e dos bens materiais”.

Ele comenta ainda que em conjunto com a DSEM devidamente preenchida, deve ser anexado um parecer técnico (que não é um laudo), elaborado pelo mesmo profissional contratado pelo condomínio. Este parecer deve descrever os seguintes tópicos constatados conforme as reais condições estruturais da marquise, tais como: estado geral da impermeabilização; situação do sistema de coleta de águas pluviais; estado de fissura e deformação da estrutura; avaliação das armações, com respeito as suas condições mecânicas e corrosão; determinação da resistência do concreto, através de métodos normatizados, e verificação de sua integridade; determinação da bitola e do posicionamento das armaduras com relação à ação do concreto; levantamento geométrico com indicação das dimensões das peças estruturais, espessura dos revestimentos e de impermeabilizações; e verificação da estabilidade da marquise segundo a NBR 6118 em função das cargas existentes.

Sobre a criação do decreto, Orlando opina que só mesmo depois dos acidentes, a Prefeitura deu mais atenção às marquises: “O estado só cria regramentos quando a sociedade não se auto organiza quanto à sua conduta nas formas de viver com qualidade e segurança. A marquise é um elemento estrutural de algumas edificações, principalmente residenciais, que demandam um item necessário para estabelecer essas condições aos seus usuários, que é a manutenção. Porém a cultura dessa mesma sociedade banaliza os parâmetros que aconselham a manutenção para que qualquer sistema construtivo obtenha durabilidade e vida útil dos seus componentes. Assim sendo, depois de muitos anos de descaso com este elemento estrutural que fica exposto as intempéries e, que muitas vezes é projetado sobre logradouro público e, que foi criado como abrigo para transeuntes, e mais, depois de muita falta de conservação por parte de seus proprietários e muitos acidentes de quedas e desabamentos vitimando e lesionando cidadãos da cidade do Rio de Janeiro, enfim, a Prefeitura após duas ocorrências que impactaram a cidade e a opinião pública, olhou para as marquises”.

Existe ainda uma lei de 2013, que também está relacionada com as marquises e obriga a “autovistoria, decenal, pelos condomínios ou proprietários dos prédios residenciais, comerciais, e pelos governos do Estado e dos municípios, nos prédios públicos, incluindo estruturas, subsolos, fachadas, esquadrias, empenas, marquises e telhados, e em suas instalações elétricas, hidráulicas, sanitárias, eletromecânicas, de gás e de prevenção a fogo e escape e obras de contenção de encostas, com menos de 25 (vinte e cinco) anos de vida útil, a contar do “habite-se”, por profissionais ou empresas habilitadas junto ao respectivo Conselho Regional de Engenharia, e Agronomia – CREA ou pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro – CAU/RJ”.

Sim, as leis são muitas e, de acordo com a síndica do Condomínio Franco Werneck, Elisabeth Bilau, a fiscalização feita pela Gerência de Vistoria Estrutural da Secretaria Municipal de Urbanismo da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro é realmente efetiva. “Eles realmente fiscalizam e está bem que seja assim porque é muito importante fazer a manutenção da maneira correta”, conta ela, que há cinco anos é síndica do prédio de 32 unidades localizado em Copacabana, bairro lotado de edifícios com marquises.

Pela quantidade de leis e pela fiscalização intensa, podemos perceber que o assunto é realmente levado a sério atualmente. Mas e se acontecer um acidente mesmo com o laudo em dia? “Se o acidente ocorrer, mesmo com o laudo estando em dia, o síndico poderá responder, caso se comprove que o dano ocorreu em razão de negligência, imperícia ou imprudência deste. Ressalto que em qualquer caso o condomínio responderá, em razão de sua responsabilidade ser objetivo, independentemente de culpa”, explica Jansen dos Santos Oliveira, advogado especializado em Direito Imobiliário.

O profissional comenta ainda que, em caso de acidentes, é fundamental que o síndico não se omita e preste o socorro devido (se for o caso) e que se coloque à disposição para efetuar os reparos que o dano causar. É importante também ter em mente que, em casos como esses, muitas vezes o síndico pode ser responsabilizado diretamente: “Na forma do artigo 7º, diz: em caso de descumprimento do disposto nesta Lei (de 2013), o síndico será pessoalmente responsabilizado, solidariamente com o condomínio, por danos que a falta de reparos ou de manutenção da edificação venha a causar a moradores ou a terceiros, salvo se o descumprimento se der em razão de deliberação em Assembleia. A responsabilidade civil do síndico ocorre quando as atribuições do cargo não são cumpridas adequadamente, ocasionando prejuízos aos condôminos ou a terceiros, bem como existe a responsabilidade criminal que acontece quando este não cumpre suas atribuições, levando-o não apenas a uma omissão, mas a uma prática que pode ser entendida como criminosa ou contravenção”, conclui.

 

Por Mário Camelo

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